domingo, 18 de setembro de 2011

Na calçada da papelaria eu sentei e chorei - Papel


Essencialmente, para desenhar qualquer papel serve. Sério. Eu nem me atrevo a questionar isso. Mas na hora do pega-pra-capar, todo desenhista tem seus queridinhos. Claro eu também tenho, não tenham dúvida disso... Porém "amarrar" a execução de um desenho/ilustração/sei-lá a um determinado material pode ser perigoso, e meio que... desinteressante.

Testar novos materiais pode ser uma prática compensadora, enriquecedora, fascinante, que vai te fazer crescer como artista, blábláblá. Pode até ser verdade, todavia estar aberto a novas experiências estéticas também pode ser perigoso. Pode apostar que é... Claro que estou me referindo a quem ainda trabalha com papel de verdade!



Papel é papel, saiu da natureza, é dividido por textura, colagem e principalmente gramatura. Tamanho eu já considero até um fator relativo, e irrelevante se analisarmos que hoje em dia o material é escaneado e dependendo da resolução é só esticar/puxar. Tudo isso você já sabe. Ótimo, então podemos ir direto ao assunto: vale tudo. É isso mesmo! Papel de grife todo mundo conhece: Canson, Miteintes, Vergê, Fabriano, e mais uma lista enorme que não adianta nada eu falar e postar imagens, porque na realidade você só vai saber o que é melhor para o seu trabalho conhecendo o material pessoalmente. Não estou dizendo para você se empolgar e comprar um bloco de cada porque eu (ou qualquer outra pessoa) disse que o papel X, gramatura Y é perfeito.

Um papel pode ser perfeito para mim, mas não será para outra pessoa, e talvez o que seja bom para uma pessoa em específico não seja bom para a maioria. Particularmente, eu uso o que eu tenho. Essencialmente, eu poderia fazer tudo com o chamequinho, o sulfite A4 nosso de cada dia. Ele é vendido na gramatura popular de 75 gramas, e eu já vi uns "econômicos" de 65 gramas. Um papel tão fino assim chega a ser um desaforo, mas há quem goste. Eu não. Sulfite sim, eu uso, claro, não nego. Mas não o de 75 gramas ou 65; por opção, uma decisão prática, eu prefiro pagar um pouco mais e usar o sulfite de 90 gramas. É mais duro, de um branco compacto, escaneia bem e tolera a manipulação (colar na mesa, descolar da mesa, riscar, apagar, riscar, apagar, finalizar, apagar, etc...). Mas como eu mesma disse, foi uma decisão minha. Dependendo do artista, ele pode preferir um opaline ou uma cartolina para fazer o mesmo trabalho. Este foi só um exemplo.

Um comportamento perigoso é amarrar uma execução a um material, por exemplo: "ah, só desenho se for no papel W da marca Z". E se um dia o material faltar num domingo à noite e o trabalho for pra 2ª feira cedinho da manhã? Este é um problema. Outro é que ás vezes o preço se torna alto demais, ou o material pára de ser importado, ou mesmo produzido.

Usar sempre o mesmo material acaba não oferecendo novidade nem na execução e nem no acabamento. Mudar de material pode oferecer isso, abrir umas possibilidades novas. Eu por exemplo descobri por tentativa e erro que alguns papéis prensados de embalagem podiam servir de base para pinturas interessantes. Prestou atenção? Tentativa e erro. É. Eu testei várias vezes, vários materiais encima de um determinado material novo para saber como ele se comportava com essas condições. E eu não fiz isso apenas no papelão. Eu procuro fazer isso todas as vezes que tento um papel ou uma superfície que é nova no meu trabalho, e o mesmo vale para materiais que eu vou (ou penso em) usar. Aqui tem um exemplo:


O papel é um sulfite 90 gramas, e o material é informado ao lado do "teste". Mesmo com este cuidado, nem sempre há garantias. Arte não é uma ciência exata, alguns resultados podem ser previstos, mas não se pode contornar resultados inesperados, por exemplo: papel 40 quilos é ótimo para riscar com lápis, aceita bem nanquim, mas borra com a maioria das tintas, ah, mas não pode apagar muito, às vezes ele esfarela ou (pior, muito pior) ele mancha com borracha. Mas por que? O 40 quilos (e os derivados 60 e 80 quilos) possui CERA na composição. Viu só? Quem pode prever? De repente você compra o mesmo papel de fabricantes diferentes e a diferença está feita.

Como eu sempre digo, nada disso é um tutorial, mas uma conversa, então ainda compartilhando experiências, vejamos alguns comentários sobre papéis e aplicações. Algumas coisas eu já comentei no meu twitter, outras vou explicar melhor aqui.

Papel para rascunho - Vale tudo. Nesta parte é hora de fechar a mão e ser criativo. Papéis para rascunhos e treinos deveriam ser a parte que menos exige do seu bolso, porque justamente a idéia aqui é riscar. Estragou? Pode jogar fora sem dor na consciência. Eu separo para treinos os lápis de cor, gizes de cera, pastéis, etc das cores que eu menos uso (no meu caso, são os verdes e azuis) e para superfície eu uso: jornal, papel de embrulho, aqueles sacos de pão que são de papel madeira/kraft, a costa de papéis que posso jogar fora depois, a costa de folhetos de propaganda que me dão na rua, aquela folha extra que acompanha as faturas de cartão de crédito/telefone/etc, e mais qualquer outra coisa que eu possa jogar fora depois. No final, elas funcionam todas do mesmo jeito, e com muito mais economia do que comprar sulfite para isso. Há quem possa argumentar que é até uma iniciativa ecológica... Eu faço isso por praticidade.

Papel para desenho - Lápis, nanquim, caneta nanquim e mediuns secos em geral. Vai com fé, que com um pouco de gramatura (acima de 100 gramas, mas nada acima de 150) quase qualquer coisa aceita estes materiais. Aqui eu uso (também depende do uso final do desenho, não vamos generalizar...) o que cabe no bolso, mas já com um investimento que visa resultado, por exemplo: papel cartão (sim, aquele mesmo da escola, mas sem acabamento acetinado ou brilhante), os famosos Canson, cartolina (sabor de infância, não?), papel madeira/kraft mais pesados, papelão de embalagem (só use se tiver certeza do que está fazendo), e outros mais famosos tipo layout, para desenho técnico, etc. Se não vai receber água na superfície, apenas tenha certeza de usar uma borracha adequada para não "ferir" o papel.

Papel para aquarela - Você pode entrar em falência facilmente na hora de comprar papéis para aquarela. Não tenho marca específica, e nem favorita. Lógico, Canson é um lugar-comum e Fabriano é um pedacinho do paraíso em forma de um bloco que custa o preço de uma alma. Técnicamente, você pode usar os papéis da Filipaper de 180 gramas (aqueles para impressora que veêm em caixinha e com várias opções de textura, cor e em preços acessíveis para os reles mortais) que faz o mesmo efeito visual. Se estiver começando na aquarela, bom... Eu pintava em sulfite quando comecei na aquarela e o mundo não acabou!

Papel para acrílica - Tinta acrílica (só no caso de quem estiver lendo isso não ter intimidade com ela) é uma tinta cujo pigmento está em suspenção em uma carga polimérica. Resumindo, quando ela seca, vira uma placa de plástico. Tem alta concentração, resistência, aderência e durabilidade. Enfim, deve ter sido o diabo que a inventou. De longe é o meu tipo de tinta favorito. Na medida certa de água, imita o efeito da aquarela; encobre camadas inferiores de cor; capaz de pintar vários tipos de superfície (tela, couro, cerâmica, isopor etc e praticamente qualquer tipo de papel), tem uma toxicidade relativamente baixa, o diluente é água e ela seca muito rápido e muito bem. Pois é, sabendo o que a acrílica é, vai entender que ela pode ser usada do papelão de embalagem ao Canson mais caro. Mas faça um teste antes, nunca se sabe...

E para arrematar, por favor... PELAMORDEDEUS... Apenas passe para um papel mais caro quando dominar a técnica. Sério.

2 comentários:

  1. hoje em dia nem na mesma marca se pode confiar, o canson por exemplo mudou a composiçao do papel e agora tem uma linha com algodão que aceita melhor aguadas mas pra quem usa lapiseira ou lapis com ponta fina o papel fica igual um rinque de patinação, cheio de marcas por causa da pressão da ponta

    ResponderExcluir
  2. Olá. Muito interessante o texto.
    Eu estou com um problema cruel...se puder ajudar...inda não me encontrei com as ferramentas certas.
    Estou tentando a colorir a mão, mas o problema é que as canetas que eu realmente gosto dos traços elas borram se eu for colorir com canetas coloridas Tombow. Tem outras, como as Sharpie que não borram. Outro problem a é que mesmo utilizando um papel para aquarela da Canson, ele parece que não aguenta muito as pinceladas dessas canetas Tombow, começa a esfarelar o papel.
    Que ferramentas você me indicaria?
    Estava pensando em talvez mexer com aquelas canetas de mergulhar na tinta nanquim...
    Outra coisa é como escanear corretamente né?
    Muito obrigado.
    Alan

    ResponderExcluir